• Abaixo a ditadura! (da burguesia)

    É incrível o número de pessoas que conhece o termo ditadura do proletariado. Tão impressionante quanto o número que não sabe que o termo nasce da ditadura da burguesia em que vivemos. Vivemos presos dentro de uma gaiola institucional que impede que as coisas realmente mudem. Por exemplo, a cada quatro anos vemos o mercado exigindo a independência do Banco Central, para que a política monetária seja independente da política eleitoral. Por trás desse desejo, está o desejo de que o mercado possa comandar o destino do país sem precisar se importar em ganhar eleições.

    Este é um dos aspectos da ditadura da burguesia. As leis de proteção à propriedade privada, mesmo propriedades adquiridas através do roubo de todo o povo, como a Vale1 são outro. A facilidade com que se realizam golpes de estado contra governos minimamente de esquerda no Brasil e em toda a América Latina é outro. Existem vários meios de garantir que o governo beneficie a alta burguesia, a elite, independente de quem seja o governo, e caso o governo contrarie os interesses desta elite, ela tem meios de fabricar um golpe de estado.

    Estes são os limites reais da democracia no ocidente. É uma ditadura de sutileza decrescente. Quanto maior a oposição, menos sutil. Então, ela pode parecer completamente democrática, desde que os interesses da elite não sejam afrontados. O renascimento do fascismo no ocidente tem a ver com a oposição crescente ao sistema econômico injusto em que vivemos. Um sistema econômico capaz de financiar o golpe de estado de 2016 para poder destruir a legislação trabalhista e submeter os trabalhadores a novos níveis de exploração.

    O nível mais sutil dessa ditadura é nos fazer pensar que ela não existe, que vivemos sob uma democracia. É esconder os limites dessa democracia, constantemente vigiada por uma pequena parcela de grandes burgueses, e que pode ser suspensa se os desagradar. Perceber esse nível mais sutil é um dos primeiros passos da consciência de classe e uma das coisas que precisamos divulgar, que o problema não é só a democracia ocidental ser uma plutocracia2 disfarçada.

  • O que aprendemos com o golpe?

    Nossa luta por um mundo melhor, pelo futuro, só é luta porque existem adversários. E, por mais desagradável que seja, é preciso saber que por vezes eles vencem e transformar nossas derrotas em oportunidade de aprendizado.

    O golpe sob o qual vivemos é o momento de refletirmos sobre que erros cometemos nesses treze anos de tímidos avanços que foram o governo capitaneado pelo PT. Essa reflexão precisa achar erros e fazer críticas, mas olhando para o futuro. A crítica não quer desqualificar as vitórias do passado, que nos foram tomadas, mas nos preparar para novas e mais duradouras vitórias.

    Falha em conquistar os sonhos

    Desde Marx conhecemos o fenômeno das classes médias se identificarem cultural e politicamente com as classes dominantes. Comprarem a agenda da elite na ilusão que são, ou um dia podem fazer parte dessa elite.

    Esse processo aconteceu por vários motivos na media em que a nova classe C apareceu. Um deles é a ideologia da meritocracia fazer parte do senso comum há décadas. Estamos há décadas repetindo histórias de superação individual da pobreza como incentivo para que as pessoas se esforcem para sair da subcidadania em que a maior parte do povo está. Essa ideologia mascara que a subcidadania faz parte da estrutura do Brasil e vende a ilusão a que os avanços nesses 13 anos foram, não por tímidas alterações dessa estrutura, mas pelo esforço das pessoas.

    Essa ilusão permitiu que a classe média comprasse o discurso liberal de menos estado e que o empreendedorismo surgisse como nova ideologia do trabalho.

    Faltou desnudarmos a estrutura da subcidadania no Brasil, as injustiças sistêmicas, os meios que o grande capital tem de sequestrar o Estado, suas políticas e recursos. A ideologia da meritocracia só pode sobreviver amparada pela ilusão de que o capitalismo é justo. Nosso papel é mostrar o quanto ele é injusto, para evitar que ao ascender economicamente o povo assuma a ideologia da elite.

    Falha em construir posições de poder

    O PCdoB define em seu estatuto três frentes de atuação: luta de ideias, organização do povo e a luta por cargos institucionais. Essa estratégia vem de uma percepção complexa sobre a origem do poder. O poder vem das crenças coletivas, da capacidade de mobilizar pessoas a partir dessas crenças e, por fim, se materializa na conquista das posições políticas e institucionais de poder, como cargos eletivos.

    O que podemos ver no longo processo que foi o golpe é que o campo democrático popular conquistou os cargos eletivos sem uma sustentação real no campo ideológico ou na organização popular. Exatamente por isso essa conquista foi tão frágil e pôde ser tão facilmente derrubada.

    Existem duas estratégias básicas para conquistar o poder, a leninista e a maoista. A leninista se baseia em conquistar o poder institucional e usar o  poder do Estado para fortalecer suas posições de poder na sociedade. Podemos ver tentativas disso no governo Lula ao convocar as Conferências Nacionais, por exemplo, mas todas muito tímidas. Voltaremos a isso.

    A maoista se baseia em uma guerra prolongada antes de alcançar o poder, para desgastar e fragilizar o adversário, para só então tomar o poder institucional. A estratégia da direita, de ataques constantes através da mídia foi uma guerra prolongada maoista que culminou no golpe.

    Desde 2005, nas acusações falsas do Mensalão, a direita vem acusando o PT de ter um plano de se perpetuar no poder, como se isso não fosse um fato óbvio, porque ele ser um partido politico e todo partido que merece esse nome tem um projeto de poder.

    Para fugir dessas acusações o PT adotou uma postura republicana até demais, como se o  poder institucional não fosse exercido por um partido. Toda discussão política nesses treze anos foi superficial e não ameaçava nunca o status quo. O governo não se mobilizou para denunciar as contradições da sociedade ou para oferecer meios reais da organização popular ter mais peso na sociedade. Sequer uma defesa mais incisiva dos direitos humanos foi empreendida, porque todas essas medidas, quando ensaiadas eram apontadas pela mídia como uma tentativa do partido se eternizar no poder e então abortadas.

    Falha em disputar a esfera pública

    A imprensa teve o papel tanto de arma quanto de campo de batalha na guerra prolongada. A opinião publicada pelos grandes jornais era quase toda a opinião publicada no Brasil durante esses treze anos, e sistematicamente alinhada com a direita política, assim, as opiniões e anseios que nós da esquerda temos foram sempre minoria. A soma de opiniões que circulam na sociedade é chamada esfera pública, e é impossível não ver nela a origem do golpe.

    Desde a campanha eleitoral de 2002 já era claro que a imprensa seria a principal oposição, mas as alternativas nas quais investimos, a imprensa alternativa, a blogosfera, as redes sociais, nunca chegaram a ter o poder que os grandes jornais tem.

    Foram treze anos acuados, em que o PT adotou a estratégia de evitar conflitos, por estar em uma posição desfavorável, sem conseguir sequer executar a estratégia leninista de fortalecer sua posição de poder a partir da conquista do estado.

    Se a principal arma usada para o golpe foi a mídia, este é um campo que precisamos disputar com tenacidade. É preciso criar canais de comunicação que chegue à maioria das pessoas, e não somente a uma minoria engajada politicamente, como é nossa imprensa alternativa hoje. A construção desses canais facilita o avanço na luta ideológica, e superação de ilusões como a meritocracia. Estes são elementos subjetivos importantes para construir uma correlação de forças mais favorável aos trabalhadores.

    A principal lição no entanto é o preço que pagamos ao assumir uma posição defensiva, evitando conflitos com os meios de comunicação e abandonando a consolidação do poder popular. Não podemos ter ilusões que a elite nacional vai aceitar que a ditadura da burguesia seja ameaçada por um governo democrático popular.

  • Agro é atraso

    Quando concorreu à presidência Dilma falava o tempo todo de Economia de Baixo Carbono sem explicar direito o que é isto. Basicamente é uma economia baseada no conhecimento, em que a maior parte do valor não vem do processo de fazer mercadorias, mas de pensá-las. A economia do conhecimento se concentra em coisas como projetos, design, programas de computador, sites, músicas, séries, filmes, etc.

    Mas desde que o barão de Mauá fez as primeiras tentativas de industrialização no Brasil, a elite nacional sempre rejeitou mudanças desse tipo. O Brasil teria uma vocação agrária inegável, e precisaria seguir essa vocação, porque é isso que a elite nacional faz, e esta elite não poderia nunca estar errada.

    Claro que quem defende esse discurso não faz só para estar certo, mas porque essa minoria dos grandes latifundiários recebe benefícios do estado, como o Plano Safra, com juros subsidiados com os impostos de todos, porque o país precisa investir em sua vocação.  Para a maior parte da população uma economia agrária não é um bom negócio, porque significa baixos salários, baixa qualidade de vida e manutenção da desigualdade social.

    As comoddities que o agronegócio produz são feitas para serem exportados em grande quantidade a preços baixos. Por isso seus produtores querem o dólar o mais alto possível, uma vez que muitos de seus custos são em reais, e querem o trabalho o mais barato possível, para que seus lucros sejam maiores. Mas para a maioria das pessoas do país, avanço seria uma economia de baixo carbono, com empregos de alta qualidade, que compete no mercado internacional.

    Acontece que o tamanho e poder do agronegócio faz com que o país não possa realizar esse salto, porque os recursos para isto são monopolizados para financiar o modelo agrário exportador e porque as medidas necessárias para alcançar uma economia do conhecimento são medidas que vão prejudicar o agronegócio.

    A burguesia nacional vive bem e mantém seus privilégios em seu nicho de mercado, fornecendo produtos primários ou no máximo semimanufaturados, e depende de que o país como um todo acredite que esta dinâmica faz bem ao país. Não é a toa que a bancada ruralista votou em peso pelo golpe.

    Mas precisamos derrubar essa narrativa, porque um país não consegue se desenvolver com produtos primários como minério, soja e carne. Nenhum país desenvolvido, em que as pessoas vivam bem, produzi principalmente commodities.

    Para que o Brasil se torne um lugar onde a maior parte das pessoas tem uma vida digna é preciso que a economia seja várias vezes maior do que hoje. Nosso PIB por pessoa é virtualmente a metade das mais pobres nações europeias,, quase um quarto do dos Estados Unidos e dobrar nosso PIB por pessoa com agronegócio é algo que simplesmente não vai acontecer.

    O modo como o agronegócio dirige a política e a economia do Brasil tem sido nossa maldição-atraso desde o império. Seus representantes políticos, hoje a bancada ruralista, antes a UDR e os coronéis, sempre foram contra todas as tentativas de modernização do país, apoiando, sem pudor, os golpes em nossa história.

    Agro é atraso.

  • Por que Temer não cai?

    Temer já causou grandes atrasos ao país, é incapaz de resolver a crise econômica e diariamente planeja retirar direitos dos brasileiros. É tanta desgraça que a gente se pega refletindo como ele consegue se manter no poder, não por admiração, mas pelo desejo de descobrir a fórmula para por fim a esse desgoverno.

    Infelizmente, a reflexão nos obriga a admitir que ele não se mantém no poder apesar de desgraçar nossa vida, mas exatamente porque faz isso.

    Costumamos ver nos jornais que Temer é protegido por uma casta política, e que por isso não cai. Que esses políticos corruptos o mantém para se proteger de investigações que podem ameaçar seu poder. O erro dessa visão é exatamente a parte da casta política. Ela presume que os políticos sejam uma classe bastante separada da sociedade em geral, que tem laços de fidelidade principalmente entre si. Mas na verdade os políticos não surgem do vácuo e tem relações só com outros políticos, ou são, desde crianças, educados para ocupar o estado. Políticos nascem dentro da sociedade.

    É importante lembrarmos disso, que os deputados e senadores que votaram para colocar Temer no poder, no Golpe contra Dilma, que votaram para o manter no poder na votação para que fosse investigado, que aprovaram medidas que prejudicam todo o povo trabalhador brasileiro, que essas pessoas não podem ser pensadas como uma classe política sem contato com o resto da sociedade.

    A cada quatro anos, desde 1990 o Diap, Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar, publica uma radiografia do novo congresso eleito e essas radiografias tem sido claras em apontar que o que costumamos chamar de políticos são principalmente empresários, seja do agro negócio, seja da indústria ou do setor de serviços.

    Assim, fica fácil entender por exemplo a participação da Fiesp no golpe, ou os inúmeros esquemas de propinas envolvendo políticos e empresas. A distorção que é falar de uma classe política esconde que os políticos são principalmente, parte da grande burguesia nacional, que a corrupção é um arranjo entre pessoas da mesma classe, que essa solidariedade que achamos haver entre os políticos se estende a seus colegas capitalistas.

    Assim, fica claro que o golpe não pode ser visto como algo separado da agenda de retirada dos direitos dos trabalhadores, de  destruição dos serviços públicos, de retrocesso para o povo brasileiro. O golpe ocorre como uma solução dessa classe empresarial para manter seus privilégios quando se sente ameaçada pela tímida ascensão da classe trabalhadora e pela insistência de Dilma no desenvolvimento nacional.

    Temer é sustentado por um grupo muito pequeno de pessoas, mas são pessoas que possuem tanto poder, através de canais de TV, grandes empresas, fortunas, amigos e parentes no judiciário, etc. que garantem a sobre vida deste governo se ele se comprometer com a política de fazer com que o país volte décadas no tempo.

    Estes grandes empresários rejeitam o plano que Dilma e PT tentavam executar, de transformar o Brasil de uma economia de exportação de produtos primários, de commodities, para um país desenvolvido. As mudanças que feitas por Temer são todas no sentido de fazer o país voltar a ser mais fortemente agrário-exportador. Reduzir salários, direitos e outros custos do trabalho como fez nos afasta de um país desenvolvido, de classe média, com mercado interno forte, para beneficiar o agronegócio.

    Temer não cai, porque é fiel aos objetivos de quem o colocou no poder.