Minha história com a “correlação de forças”

ou: Da necessidade de uma “engenharia” na política

Quando comecei a frequentar reuniões partidárias, comecei a ouvir algumas expressões, como “análise de conjuntura”, “correlação de forças” e, claro, ficava com vergonha de perguntar “O que é isso?”. Tenho a impressão que o círculo de “cracudos da política” tem um léxico próprio e assume que todo mundo que entra nesse círculo tem obrigação de saber o que os termos significam.

Lembro de, com algo como 16 anos, ficar me perguntando, lá pela quarta, quinta reunião o que significava “análise de conjuntura” e do momento de compreensão súbita de que “correlação de forças” não era apenas comparação de potencial eleitoral, mas algo mais amplo, incluindo a capacidade de mobilizar recursos para suas ações, e etc.

Todos os espaços políticos que participei valorizavam muito a leitura e o estudo: entender “teoria”. Citar os pensadores, fazer “análises de conjuntura” profundas, te garante bastante status nesses espaços (e no Twitter). Mas (e olhe a cartada de autoridade) parafraseando Marx, não é mais tempo de analisar a correlação de forças, mas de transformá-la.

Nossa “teoria” política se aproxima muito da física teórica. Concebe conceitos e enquadra a realidade neles. Um esforço analítico imenso. Mas na hora de fornecer ferramentas teóricas para transformar essa realidade, sinto que não conseguimos ajudar muito o garoto de 16 anos que não sabia muito bem o que era aquilo tudo que estavam falando. Sinto falta de uma engenharia, que ofereça algumas respostas práticas.

Por isso, o incentivo a estudar que recebi, que me fez ler Lênin e Gramsci mais tarde, não me ajudou muito a entender como poderíamos mudar nossa correlação de forças. Temos ótimos textos sobre as condições políticas russas antes e após a revolução, mas muito pouca coisa sobre o Brasil do século XXI. Por mais que admire Lênin não posso acreditar que seja possível transpor facilmente qualquer uma de suas soluções, seja “paz, pão e terra”, seja “todo poder aos sovietes” aos nossos problemas.

Estudamos muito a correlação de forças, mas pouco quais seriam estratégias viáveis de acumulação de forças. Quando debatemos, aparecem propostas genéricas como “voltar às bases”, que por mais que estejam certas, são abstratas demais para terem a utilidade necessária.

Existem regularidades. Existem situações similares. Precisamos de alguma compilação de conhecimentos sobre como atuar politicamente em espaços similares: escolas, periferias, unidades de saúde, sindicatos… Respeitar as singularidades de cada condição concreta não significa não oferecer um método. Paulo Freire, mestre em respeitar as realidades locais, ofereceu um método.

Voltando à correlação de forças, com o tempo descobri que existem caminhos para que acumular estas tais forças em correlação. Entidades precisam comprar aos poucos ferramentas que possam ser usadas para várias atividades, aumentando sua capacidade de mobilização; precisamos registrar os contatos do máximo de pessoas que participam de atividades, e, principalmente, mobilizar estes contatos; construir projeção midiática de potenciais candidatos; e mais uma série de estratégias práticas.

Nesse mesmo tempo de descobertas, percebi que no dia a dia de mobilizações, atos de rua, congressos e eleições de entidades, raramente temos este tipo de cuidado, por falta de tempo e orientação, excesso de urgência e imediatismo.

Meu palpite é que grande parte dessa carência é falta de “pegarmos na mão” e ensinarmos as cosias aos jovens de 16 anos. O excesso de ego e a supervalorização da teoria sem práxis, e práxis é organização.

Fiquem com Malcon X.

Foto de Malcon X com a mão no rosto e olhar pensativo com a legenda "We are not outnumbered. We're out organized."
Nós não somos minoria. Nó somos desorganizados. (um trocadilho no original)

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